Natália Abreu Damasceno
Graduanda em História. Universidade Federal de Sergipe.
Programa de Educação Tutorial (PET)/ UFS.
Grupo de Estudos do Tempo Presente/ UFS
e-mail: natalia.abreu.d@gmail.com
Após o sucesso do bestseller Uma Breve História do Mundo publicado em 2000, o australiano Geoffrey Blainey, professor em Melbourne e em Harvard, apostou novamente na síntese de períodos de longa duração. Em 2005, lançou o livro Uma Breve História do Século XX, cuja primeira edição brasileira só foi lançada pela editora Fundamento Educacional em 2008. Esta obra narra, mais que os grandes acontecimentos do século, o extenso processo de transformação vivenciado pela humanidade ao longo dos novecentos.
Evidentemente, ao tentar abarcar todo o século XX, incluindo seus diversos conflitos e dilemas políticos, econômicos e socialis, a narrativa de Blainey revela um previsível grau de superficialidade. Afinal, trata-se de um século descrito em 309 páginas. Porém, ao optar por abandonar muitos dos jargões e reflexões densas, típicas das obras historiográficas, o autor produz uma narrativa leve e acessível aos aficionados de diversas áreas do conhecimento.
Deste modo, a isenção de uma análise robusta dos acontecimentos, do número excessivo de datas, nomes e dados científicos afasta esta obra do mundo acadêmico e coloca-a nas mãos do grande público. Vale lembrar que as freqüentes inferências do autor sobre o cotidiano, seu recurso a conceitos como “mentalidade” e “espírito de época”- explorando curiosidades e por vezes adentrando na história da vida privada - despertam o interesse de um público mais heterogêneo e distanciam a obra das frias narrativas dos livros didáticos.
Uma Breve História do Século XX foca-se nos três grandes conflitos mundiais ocorridos neste século: a Primeira e a Segunda Guerra Mundial, e a Guerra Fria. A Primeira, descrita como as demais com vivacidade jornalística, é entendida por Blainey como uma ruptura no otimismo que vinha se estabelecendo nas civilizações devido aos avanços conquistados no fim do século anterior. O século XX era um século promissor: a Europa era o lar de vastos impérios e de poderosas nações consolidadas, os Estados Unidos eram a terra da inventividade e do rápido crescimento econômico. A democracia e a liberdade começavam a invadir os territórios ainda que apenas em uma parte do mundo. Tudo levava a crer que, nas regiões não atingidas pela prosperidade, os ventos da mudança chegariam mais cedo ou mais tarde.
Geoffrey Blainey chama de “segunda era inventiva” o período que vai de 1850 até a Primeira Guerra Mundial. Nesse período,segundo ele, as diversas inovações tecnológicas como o telefone, o gramofone, a câmera e o avião, tornavam o mundo menor, mas “O fato de o mundo estar se tornando menor não significava que necessariamente ficava mais amigável” (BLAINEY, p. 41, 2008). Os crescentes gastos com armas, navios de guerra e com o exército foram o prenúncio de que as batalhas de pequena escala freqüentes no início do século, período que até então era considerado pacífico entre as grandes potências, culminariam num estrondoso conflito mundial.
A Europa, até então leito das grandes economias e acontecimentos, é retratada como palco de diversos conflitos étnicos, econômicos, políticos, religiosos e ideológicos há muito iniciados, mas que se acentuaram neste século. Assim, eventos como a Revolução Russa, a crise de 1929, as tensões do tratado de Versalhes, a criação da Liga das Nações, a ascensão de regimes totalitários autoritários e fascistas nos anos 20 e 30 e o nascimento de uma Turquia independente do islamismo são abordados sob um ponto de vista que enxerga o século XX como um período de intensificação das diferenças através da supressão do espaço.
Já a Segunda Guerra Mundial, que contou com armas e estratégias mais avançadas, aparece nesta obra de Blainey como um atestado temporário de colapso das democracias, agravado pela tomada da França pelos nazistas em 1941. O massacre de judeus, ciganos, homossexuais, a invenção de armas letais sofisticadas, a voraz expansão do império japonês na Ásia Oriental e o mistério da vida na União Soviética compuseram o cenário de terror e incertezas que assolou o mundo durante este conflito. O fim da guerra trouxe mais dúvidas que explicações. As nações européias deixam de ser as grandes potências e o mundo polarizou entre os Estados Unidos e a União Soviética. O mapa europeu mudou novamente e grandes investimentos científicos começara a ser feitos. Iniciara a chamada Guerra Fria.
Ao tratar da segunda metade do século XX, que o autor entende como o momento de triunfo e consolidação da verdadeira democracia, Blainey não desenha somente um panorama das batalhas, dos acordos e dos impasses políticos e militares que ocorreram durante a Guerra Fria. Evidencia também, nesse período, a emergência de movimentos ecológicos, pacifistas, musicais e feministas enquanto partes de um processo de mudanças que configurariam mais tarde os valores, o comportamento e a moral da sociedade do século XXI. Delineia este processo inclusive, englobando diversos âmbitos como o dos esportes, das línguas globais e da urbanização das cidades.
Deste modo, Uma Breve História do Século XX é repleto de escolhas feitas pelo autor (umas louváveis, outras nem tanto). Afinal de contas, ao mesmo tempo em que fornece um painel dinâmico dos principais acontecimentos históricos ocorridos no referido século, falha na problematização de alguns e até no esquecimento de outros, como por exemplo, da política do Apartheid (1948-1990), relevante problema na história dos novecentos que não é sequer mencionado na obra. Por fim, Geoffrey Blainey possui o mérito da boa síntese, em uma obra relevante que compila informações históricas de diversas naturezas. Porém, a crítica que por vezes é ausente no livro, não deve faltar ao leitor.
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