Aluno: Paulo Roberto Alves Teles
e-mail: pauloteles_aju@hotmail.com
Orientador: Dilton Cândido Santos Maynard
Grupo de Estudos do Tempo Presente/Universidade Federal de Sergipe
Ambientado em uma região marcada pela presença de espaços multiculturais e de tolerância étnica, Steel Toes (2006) - em português, Botas de aço – narra a história de um jovem skinhead neonazista, Mike Downey (Andrew Walker), responsável pelo assassinato de um indiano na cidade de Montreal (Canadá). O crime, motivado por questões raciais, desemboca na designação de um advogado judeu e liberal, Danny Dunkleman interpretado por David Strathairn (indicado ao Oscar®).
A película foi dirigida pelos diretores Adam Mark e David Gow e apresenta uma série de debates sobre questões cada vez mais freqüentes no alvorecer do século XXI: Crimes motivados por intolerância racial. O crescimento de movimentos e tribos urbanas que pregam a xenofobia, ideias neofascistas e o anti-semitismo são alarmantes, um sintoma de problemáticas a serem discutidas com urgência.
Nesse sentido, a produção de diversas filmografias na primeira década do século XXI como, por exemplo, Tolerância Zero (2001), Fuhrer-X (2002), Hooligans (2005), This is England (2006) e o próprio Steel Toes (2006), despertam a atenção e o intuito de promover uma breve análise historiográfica para que através dela, possamos levantar possíveis questões e respostas iniciais sobre a escolha constante dessa temática e, é claro, o crescimento desses atos e movimentos de intolerância.
As primeiras cenas do filme por si só já demonstram uma clara intenção dos diretores em estabelecer o contraste entre os dois personagens. De um lado, o jovem skin neonazi Mike Downey (Andrew Walker) comete um crime brutal e o seu comportamento é apresentado em tons animalescos, incontroláveis. Do outro, o advogado Danny Dunkleman (David Strathairn) é apresentado como um indivíduo tolerante, passível a estabelecer primeiramente o diálogo para resolver quaisquer problemas. A diferenciação de espaço físico e iluminação também são evidentes. O jovem garoto é apresentado à noite, cometendo invariavelmente atos ilícitos, como vandalismo, atentado ao pudor e assassinato. Já Dunkleman é apresentado ao dia caminhando por ruas onde convivem harmoniosamente judeus, punks e negros.
As discussões iniciais da obra são iniciadas no momento em que Dunkleman, advogado judeu, é selecionado para defender um indivíduo que prega o anti-semitismo e a violência como respostas para o mundo atual. Mesmo que, não estivesse inicialmente satisfeito com o caso, Dunkleman prossegue com o seu trabalho e inicia a formulação da defesa. A partir daí, inicia-se no filme uma profunda e tensa relação de choque entre as formas díspares de encarar a realidade e através dela há simultaneamente a construção e desconstrução dos personagens. A obra não deixa clara a posição de protagonista no filme, já que essa posição é alternada entre defensor e acusado e em alguns momentos da película, estes exercem essa posição de forma simultânea.
Se percebemos no decorrer da película o início de um processo de humanização e construção de padrões morais e éticos no jovem neonazi, também percebemos a desestruturação pessoal ocorrida na vida de seu defensor. Dunkleman se afasta dos amigos, assiste melancolicamente o fim do seu casamento e entra em choque com seus mais profundos valores morais.
Mesmo diante da insatisfação e das adversidades, o defensor prossegue no caso por entender que tanto o jovem neonazi e o movimento o qual ele integrava deixavam clara as suas intenções de torná-lo um mártir da suposta causa. E é justamente nesse contexto que se desemboca a principal cena do filme, onde o garoto em estado de frenesi encena para o seu advogado uma postura de soldado do movimento skinhead e através daquela situação, Dunkleman desconstrói e põe em xeque as ideias de Mike Downey, deixando claro que ele não era um mártir, mas sim um fantoche de interesses escusos não abordados pelo filme, já que este se concentra muito mais no indivíduo e não no movimento.
O filme se encerra com a condenação de Downey, porém este não é o ponto central de conclusão, mas sim a disposição de regeneração e de absorção de concepções novas que permitissem ao acusado a capacidade de conviver em um universo marcado por diferenças. Além disso, o reconhecimento de que precisava de ajuda e que ele não poderia ser o único culpado por um problema sistemático também são pontos marcantes no desfecho da película. Ainda no encerramento, a obra deixa claro que o jovem não é o único que precisa de ajuda, Dunkleman é apresentado de forma debilitada devido aos reveses ocorridos em sua vida pessoal. Mesmo assim, ambos deixam evidente a disposição de vencer juntos as fraquezas, os temores e as dúvidas de uma maneira que não seja através da violência gratuita ou do puro e inexplicável ódio ao desconhecido.
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